quinta-feira, 8 de novembro de 2012

O corpo cicatrizado




Era contínua a superfície do corpo
Vastidão de infinitos poros
Como um tecido fechado
Uma seda dura.
A garantia modelada, impreterível.
O escudo da certeza.

Diante da fragilidade orgânica
Eis que  rompeu
Como uma estria d’alma
A pele rasgou
do dentro pro fora.
A rede ferida, sangrou.
Mudou de cor
Para púrpura-hematoma
 Ardeu, como uma queimadura
Desfiava
Desfazia.

Morria...

Mas por tempo ou por carne
Regeneraria.
Com pontos largos
Pela  agulha da vida
A tez se costurava.
Cicatrizava comedida.
Curaria?

Enrijeceu marcada, à espera das novas fissuras.  
Cicatrizada...



sexta-feira, 3 de agosto de 2012

O verdadeiro castanho



Olhei no espelho e minhas pupilas estavam dilatadas, o castanho estava tão perto de mim. Lembrei-me daquele trecho de  música da Legião que diz a”Tempestade é da cor dos seus olhos castanhos”.Procurei a tempestade dentro da imagem refletida de meus olhos.Ambos começaram a piscar ,inquietos, por se sentirem fitados por mim.
Pareceu que os olhos me buscavam me enxergam por dentro. enquanto  que eu esforçava-me com demasiado encanto enxergar o castanho e o escuro dos olhos.Procurava alcançar o fundo.O que estaria guardado lá?
Nos olhos, os meus olhos, presos no espelho.
Seria uma tempestade de apenas chuvas?
Receio que não, conhecendo a natureza daquele campo de visão.
Seriam, por certo, tornados.
Tornados que tornavam o olho em olho.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Vês



(Vladimir Kush  -  O Sol,a Luz e o Ovo )


A vida que nós levamos
Vivêramos
Sobrevivência

Vivendo
Viveres
Vivido(s)

Vivei
Vivências
Semivividas

Vivêssemos
Sobrevidas

Vivêramos
Sobrevivência
Vivendo
Sem-vida

Viverás
Subvidas

Viverias
Antivida

Viver
Vida
Vive-se
Vivo
Vivamos
Viva
Vivendo
Vivas!

 Viverão
Revivências

Viveremos
A vida que nos leva.

domingo, 22 de julho de 2012

Bilhete etílico



Eu sei que isso é meio estranho, mas não vou à manhã. Porque sei que estou bêbada agora. São várias as cartas que eu me escrevo quando estou bêbada, parece até que tem uma Aline querendo falar com a parte que processa as ações;então resolvi escrever pra você .
Pra quem sabe isso tudo chegar a tona. Você sabe que adoro escrever. Entre personagens, histórias, pessoas e realidade me encontro meio perdida. Não me sinto protagonista em nada. Como se eu fosse eternamente a coadjuvante que exerce papel elementar, aquele que não sabe o desfecho, mas o imagina arduamente; Sei lá.
 Às vezes me sinto muito iludida por um final feliz que é mera representação.
Eu sei que discutimos, que você  acha que na maior parte das vezes as pessoas nos decepcionam...mas e se?e se for diferente?
Essas conversas, nas quais pareço não estar concentrada, me tiram o  sono.Completa autoanalise isso daqui.
Cuide disso, por favor.
Parece loucura. Mas me lembrei de colchas de retalho sem querer.
E depois de tomates verdes fritos.
Parece que de certa forma eu quero que você saiba, como um mau hábito que insiste em ressurgir. Tenho a mania de simplificar o problema alheio,para ser mais fácil...
Mas mesmo assim não é,
A solidariedade tem acabado comigo, a cada fez que meu momento feliz morre pela desgraça alheia. Se eu for esperar estar tudo ok, pra ficar bem, sim estarei perdida. Amanhã não acordarei  à  tempo mesmo.
Será que isto está denso demais; Tão tenso ou denso quanto eu jamais conseguiria pronunciar?
Abelhas tomam néctar de morangos?
Estou bêbada, mas você ainda é meu melhor amigo... será que alguém me engana?Preciso conversar?
Sinto-me entregue no momento à água, pode ser corrente marítima. Ou sono.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Miragem vazia

(Tarcila do Amaral - O sonho)

Um dia de uma cor só
Vista que não refratava nenhum interesse
Onde todas as imagens já foram decifradas
Mantinha-se cansada.
Retina cicatrizada.
Cansada de olhar
Pupilas ansiosas
Vontade de escuridão
Dormir, não serviria
Os sonhos traziam vitrines
Iris em sépia, inanimada.
Exaustão pelo ver.
Cculpa pelo não querer.
Era o olho então?
Uma grande cavidade absorvente?
Parecendo um dado viciado
Domesticado a compreender   
Ingrata.
Parecia um labirinto de imagens ocas.
As gotas marejavam, ardiam.
Fitava fosca toda a superfície
Não havia nenhuma camada de luz.
Queria uma cor nova.
Sorria com o olhar vibrado:
Imitando a tristeza que acomete o corpo após um banho quente.

domingo, 15 de julho de 2012

Sempre ia



(Van Gogh )
Outrora eu vivia
Entretida na rígida rotina
Em constante monotonia
Presa entre as certezas ruídas.
Na maquiagem enraizada.

Outrora eu padecia
Pelas mil roupas que vestia
E depois despia.
Não me reconhecendo enquanto nua.

Sendo como nota repetida.
Habitada pela masoquista nostalgia
Das inúmeras peles que em mim cabia.

Antes não percebia
O tanto que meu corpo podia.

Agora me sinto vasta.
Não mais vazia.
Fluída em várias
Entre muitas vias.
Estrangeira em mim mesma
Infinita em minhas fronteiras.
Dispersa, disposta
Transposta em poesia.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Doce de nuvem



Ao olhar as nuvens pela janela do quadro ambulante, pensei que estivessem penduradas por fios de nylon, amarradas num prego preso no azul do céu.
Será possível tocar a textura das nuvens?Ou em uma trama de gotas, elas fugiriam com velocidade de vapor?
Parecem-me tão fluidas livres em seu planar. Viajam peregrinas pela umidade do ar.
Brisa sempre branca.
Talvez tenham gosto de algodão doce, que de tão açucarado fica preso nos cantos de dentro da boca.
Ora alvas, ora cinzas.
Talvez sejam geladas, frescas como o orvalho do gramado.
Às vezes um pouco mais salgadas, como as nuvens que sobrevoam o Mar...
Entre nuvens carregadas já saturadas e nuvens que apenas nublam, vem o ato distraído, lúdico., de tentar achar figuras escondidas.
As nuvens também choram e ganham corpo através das lágrimas
Transformam-se do claro para o escuro.
NuanceS de palidez, alvo inalcançável.  
Alguns dizem que são apenas água disfarçada...
Não sei se todos os dias são dia de nuvem.
Ou sei. Não sei...







sexta-feira, 13 de abril de 2012

Corpo de fundo

As palmas dos pés ardiam, os dedos adormecidos nada sentiam, já havia peregrinado por um longo caminho. Ela não tinha noção do espaço que ocupava no trajeto,mal enxergava o horizonte,não tinha um rumo exato apenas se movia.Estava cega,não conseguindo mirar nada alem de dois passos no chão,seu campo visual era embaçado e restrito,não cabia nenhum detalhe naquele momento.Seus joelhos tremiam já exaustos,as coxas formigavam estressadas pelo esforço que iam alem daquela estrutura.Sentia como se sua cabeça tivesse sido separada de seu corpo,sendo que seus membro movimentavam-se de forma fissurada,enquanto sua mente ainda estava parada,inerte naquele quarto do quinto andar.Parecia que haviam lhe tirado todo o sangue,invadida por um frio cortante em pleno verão de Janeiro.Não corria pois não haveria ar suficientemente capaz de agüentar seu desejo de sumir dali.Apenas caminha com pouco fôlego,incerta das ruas que a percorriam.Todo a pele erriçada,doía como um rio de navalhas a penetrar-lhe os póros.

-Será que falta muito ainda?-um pensamento desesperado que a suprimia entre a taquicardia.

Distraiu-se: tropeçou em monte de areia que se amontoava na frente de uma construção.Seguiu inabalada,com apenas alguns grãos de areias a esfoliar a camada macia de pele entre os dedos dos pés.Os passos eram duros,mecânicos ,destilavam frieza e indiferença.

Havia ficado nua,se despira ,ficando totalmente vulnerável àquele que não existia. Ela sobrara sem roupas no mundo que atravessa e rompe com todos os sonhos.Violada,porem ansiava em um desejo masoquista de dar mais ainda,mais do que podia,poderia talvez,despir-se da pele que a cobria.Quem sabe assim ele a acharia normal,toda aberta e disponível.

Sendo apenas carne quente, carne dele.

Estaria talvez enlouquecendo e se lembrou de quando aprendeu andar de bicicleta, havia a antiga promessa de que tudo talvez fosse como dominar a arte de pedalar; apenas controlando o destino e mantendo o equilíbrio. Mas o destino não tem forma e quando achamos que o encontramos a imagem perde o foco.O equilíbrio por sua vez escorre pelos vãos de nossos dedos,nos deixando em luto de sua fluída certeza.

-Que horas são?

Queria derrubar o Sol só para contemplar a terra queimando no fogo.

Como sangrava aquele corpo, amolecido pelo doer.

-Estou muito longe do mar?

domingo, 11 de março de 2012

Postergação





Gosto do gosto


Do sonho


De quando acordo


Tendo dormido


Ao seu lado


Gosto de fruto


Do seu rosto


No meu rosto


Deixando tudo fosco


Enquanto reclamo


Que ainda é pouco


Tudo,o todo.


O todo,tudo.


Quero o gozo do corpo


Com o cheiro elevando


Ficando cada vez mais composto


Sendo tudo nulo


Posto que é apenas um sonho.


Com gosto de acordado.


Lutando pra não ser morto.



quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Ecoando passos



Será que dá jeito depois?

Quem vai querer?

Ouvir tocar a valsa que não fiz?

O mesmo lamentar de outrem

A severa nota a riscar

Como quem não quis

Era velha valsa sim

Retumbava por aí

Pótrm,nunca inagurará em mim.

Eu quis.

Mas quem mais quisera assim?

Ele não a tocara...

Cantei em solo.

Foi assim.

Assim que foi.

Ecoando entre motriz

Vós sabe que sim.

Mesmo que quiserás não

Quimerás?

Quisera a mim?

Entere milhares

Eu era a mil.

Era vil.

Deveria cessar

Mais nada entoar.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Medo de escrever



"Tenho medo de escrever. É tão perigoso. Quem tentou, sabe. Perigo de mexer no que está oculto, e o mundo o não está á tona, está oculto em suas raízes submersas em profundidades do mar. Para escrever tenho que me colocar no vazio, Nesse vazio terrivelmente perigoso: dele arranco sangue. Sou um escritorque tenho medo da cilada das palavras: as palavras que digo escondem outras - quais? Talvez as diga. Escrever é uma pedra lançada no poço fundo."

Clarice Lispector.